- Eles chegarão no trem das 7h,
senhor. Estão entre trinta. Devo informar o diretor? - perguntou o guarda.
- Não. Ele já têm coisas o
suficiente para se preocupar. Eu cuido desses novos “hóspedes”.
E saiu, com a cara fechada;
carrancuda e mal-humorada que carregara durante aqueles longos 45 anos de
trabalho. Uma pena que não duraria muito mais do que isso. Era um velho
rabugento; lúgubre. Havia se tornado uma pessoa fria, vivendo praticamente mais
da metade de sua vida naquele lugar que, pela falta de compreensão, era também
um lugar frio. Os anos foram, aos poucos, tirando tudo o que tinha. Até o
emprego, por assim dizer. De algo que
fazia parte da vida do médico, tornou-se algo do qual o médico fazia parte. O
casamento se desfez como se desfazem os castelos de areia fina na praia quando vêm o vento ou quando a maré
sobe à noite apagando os rastros humanos que vagaram por ali durante o dia. O
relacionamento com os filhos – se algum dia houve um - nunca fora bom, nunca
fora nem normal. Não era só o seu rosto uma coisa fechada, mas também todo o
seu interior. Não havia se casado por amor, nem mesmo por dinheiro. Era uma
união medíocre, fruto de um desejo por uma estabilidade social e financeira de
ambos os lados, ilusória. Casou-se por um favor, e mesmo com a distância, nunca deixou de amar
sua esposa.